Wednesday, November 30, 2011

O resto do fim

O resto não importa. Os cotovelos desmesurados do desamor, o arrepio fingido dum beijo que não chega, nem se atreve a sair de casa, a preguiça duma cama que se espreguiça e adormece de novo. Não importa a saudade, a inocência roubada, a carta esquecida no bolso do casaco. E, depois disso, também não importa o não-querer, o mal-me-quer, o tanto faz da mensagem do pecado. Desaprendi tudo. Até o que me ensinaste entre o sofá e a cama e me pediste para decorar de olhos fechados. O teu nome, escrito em maiúsculas, o tamanho da tua mão, a agarrar a minha, o calor da tua vergonha dentro de mim. E o teu cheiro, a incenso-canela, que entretanto foi parar ao quintal da vizinha. A culpa morre solteira, assim como as lembranças que carrega ao colo e abandona na primeira sarjeta. Depois do abandono, como calculas, pouco sobra para contar como foi. Mas foi mais ou menos assim. Vivemos o que havia a viver, enquanto queríamos e podíamos. Enquanto tínhamos braços para nos segurarmos (ou empurrarmos) e uma dose de loucura para nos acharmos super heróis da história que não parecia ter fim. Mas teve. Vivemos até ao limite e quando lá chegamos, ao limite, fizemos um banquete a dois. Provamos de tudo até ficarmos fartos e, sem arrumar loiça e aparato, fugimos de balão para o fim do mundo. Que não é nada do que se fala. Ao contrário, é escuro e cheira a podre, sem loja de souvenirs e monumento da praxe. Uma ampulheta de desencanto. O fim do mundo é um lugar onde adormecemos amantes e amanhecemos estranhos num vão de escada. E entre as fotografias com personagens do século passado e as poses ridículas de felicidade pronta-a-vestir, não há mais fundo do mar aonde procurar tesouro. Nem castelos com pontes para nós. Morreste-me de repente e nem por sombras procuro o teu fantasma. Porque esta cidade acordou sem ti e, contra todas as expectativas, acordou na primavera.

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