Wednesday, September 14, 2011

Trabalho de casa

E como se vive depois de ti?

Não me mostres a equação. Dá-me a senha e, por via das dúvidas, a contra-senha. A sina, a solução, a chave mestra, a fórmula sagrada. Oferece-me a fuga de ti. Aponta para a recta que não se cruza com o teu cheiro, afasta as estrelas, apaga a lua, mata o sol e espalha as cinzas num mar que desconheça a forma das tuas mãos. Permite-me não te querer mais. Mesmo que me queiras, ainda mais. Faz de conta que és rei e ordena que me expulsem do reino por desacato à autoridade. Que és tu, meu amor. Infringe todas as regras e atravessa a passadeira em hora de ponta. Obriga-me a pagar uma multa por excesso de ti. Segue os sentidos – certos – e obrigatórios e deixa-me ficar numa esplanada sem vista para ti. Ajuda-me a deitar ao lixo os desperdícios que por aqui sobraram entre os pequenos almoços e as madrugadas-lareira. Ensina-me o que desaprendi sobre os outros. Aqueles que nunca me interessaram. Traduz as palavras difíceis que não dependem de nós. Ajeita-me o cabelo e diz-me, olhos nos olhos, quem, depois de ti, pode entrar só porque sim. Dá-me uma bússola que aponte para o norte, e não para o teu chão. Conta-me a história dum primeiro beijo. Procura o meu coração e pede-lhe ao ouvido que volte para casa. Fala-me de tesouros no fundo da alma, segredos de cabeceira, cartas que chegam ao destino. Diz-me em que lugar escondo o nosso riso, a tua poesia e a minha prosa. O que faço à música? Onde tranco o silêncio de um abraço tatuagem. O que faço ao amor? Ao meu amor que, sem ti, virou vagabundo. Agora explica-me, por favor. Como se vive depois de ti?

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